sábado, 19 de junho de 2010

A cruz de Cristo é motivo de esperança, diz pregador do Papa

Da Redação, com Rádio Vaticano
Paula Dizaró / Roma

Adoração à Santa Cruz durante a Celebração da Paixão de Cristo



"A cruz de Cristo é motivo de esperança para todos", afirmou hoje, 10, o pregador da Casa Pontifícia, Frei Raniero Cantalamessa, na homilia da Celebração da Paixão de Nosso Senhor. As funções litúrgicas foram presididas pelo Papa Bento XVI, na Basílica de São Pedro. no Vaticano.

O rito da Paixão do Senhor consiste na proclamação da Palavra de Deus, a apresentação e adoração da Cruz, e a comunhão dos fiéis. Durante a Liturgia da Palavra, é lida a narração da Paixão segundo o Evangelho de São João.

.: Fotos da Celebração da Paixão

Após a Liturgia da Palavra, Frei Raniero Cantalamessa, fez a homilia propondo algumas passagens dos escritos de São Paulo sobre o mistério da morte de Cristo, que estamos celebrando. E recordou, o Ano paulino em andamento – no bimilenário do nascimento do Apóstolo dos Gentios – afirmando que ninguém melhor que São Paulo pode ajudar-nos a compreender o significado e alcance de tal mistério.

Mistério da morte de Cristo

O religioso ressaltou que "a morte de Cristo tem um alcance universal: 'O amor de Cristo nos compele, considerando que, se um só morreu por todos, logo todos morreram' (2 Cor 5, 14). Sua morte deu um sentido novo à morte de cada homem e mulher".

Aos olhos de Paulo, a cruz assume uma dimensão cósmica. Frei Cantalamessa lembrou que "a antiga tradição desenvolverá o tema da cruz como árvore cósmica que, com o braço vertical, une céu e terra e, com o braço horizontal, reconcilia entre si os diversos povos do mundo".

Evento cósmico e ao mesmo tempo personalíssimo, observou o pregador da Casa Pontifícia: "me amou e se entregou por mim" (Gal 2, 20). Cada homem, escreve o Apóstolo, é um "daquele por quem Cristo morreu" (Rom 14, 15).

"Paulo plantou a cruz no centro da Igreja como mastro principal no centro do navio; tornou-a fundamento e centro de gravidade de tudo. Fixou para sempre o quadro do anúncio cristão. Os evangelhos, escritos depois dele, seguiram o esquema, fazendo do relato da paixão e morte de Cristo a base sobre a qual tudo está orientado."

Desafios atuais da fé

A finalidade do Ano paulino – observou o frade capuchinho – não é tanto conhecer melhor o pensamento do Apóstolo, é mais, como recordou em muitas ocasiões o Santo Padre, aprender de Paulo como responder aos desafios atuais da fé.

O pregador da Casa Pontifícia identificou num desses desafios, talvez o mais aberto e mais conhecido até hoje, um slogan publicitário escrito nos meios de transporte público de Londres e de outras cidades européias: "Deus provavelmente não existe. Portanto deixe de se preocupar e aproveite a vida".

"O elemento de maior preocupação desse slogan não é a premissa 'Deus não existe', mais a conclusão: 'Aproveite a vida!' A mensagem subliminar é que a fé em Deus impede de desfrutar a vida, é inimiga da alegria. Sem essa, existiria mais felicidade no mundo! Paulo nos ajuda a dar uma resposta a este desafio, explicando a origem e o sentido de cada sofrimento, a partir do sofrimento de Cristo."

Porque "era necessário que Cristo padecesse para entrar em sua glória"? (Lc 24, 26). A necessidade não é de ordem natural, mas sobrenatural, observou Frei Cantalamessa, acrescentando que nos países de antiga fé cristã se associa quase sempre a idéia de sofrimento e de cruz à de sacrifício e expiação.

São Paulo escreve que Deus predeterminou Cristo "a servir como instrumento de expiação" (Rm 3, 25), mas tal expiação não opera sobre Deus para aplacá-lo, mas sobre o pecado para eliminá-lo. "Pode-se dizer que é Deus mesmo, não o homem, que expia o pecado... a imagem é mais a da remoção de uma mancha corrosiva ou a neutralização de um vírus letal que a de uma ira aplacada pela punição".

Pecado, principal causa da infelicidade

O pregador da Casa Pontifícia evidenciou que Paulo leva a sério o pecado, não o banaliza: "O pecado é, para ele, a causa principal da infelicidade do homem, isto é, a rejeição de Deus, não Deus! Isso prende a criatura humana na 'mentira' e na 'injustiça' (Rm 1, 18 ss; 3, 23), condena o próprio cosmo material à 'vaidade' e à 'corrupção' (Rm 8, 19 ss.) e é a causa última também dos males sociais que afligem a humanidade".

Fazem-se análises sem fim da crise econômica em ação no mundo e de suas causas, mas quem ousa meter o machado na raiz e falar do pecado? – perguntou-se o religioso.

"O Apóstolo define a avareza insaciável uma 'idolatria' (Col 3,5) e aponta na desenfreada ganância de dinheiro 'a raiz de todos os males' (1 Tm 6, 10). Podemos dizer que está errado?" – insistiu Frei Cantalamessa.

"Por que tantas famílias perderam tudo, massas de operários que permanecem sem trabalho, se não pela sede insaciável de lucro por parte de alguns? A elite financeira e econômica mundial se tornou uma locomotiva louca que avançava em curso desenfreado, sem pensar no restante do trem que ficou parado à distancia sobre os trilhos. Estávamos andando todos na 'contramão'."

Cruz de Cristo é esperança para todos

O religioso observou que o sofrimento permanece sendo, certamente, um mistério para todos, especialmente o sofrimento dos inocentes, mas sem a fé em Deus ele se torna imensamente mais absurdo.

O pregador da Casa Pontifícia concluiu afirmando que "a cruz de Cristo é motivo de esperança para todos, e o Ano paulino, uma ocasião de graça também para aqueles que não acreditam, mas buscam. Uma coisa fala a favor deles diante de Deus: o sofrimento! Como o restante da humanidade, os ateus também sofrem na vida, e o sofrimento, uma vez que o Filho de Deus tomou sobre si, tem um poder redentor quase sacramental. É um canal, escreve João Paulo II na 'Salvifici doloris', através do qual a energia salvífica da cruz de Cristo é oferecida à humanidade".

Frei Cantalamessa encerrou citando uma comovente oração feita na liturgia desta Sexta-feira Santa, logo após o convite a rezar "por aqueles que não acreditam em Deus":

"Deus onipotente e eterno, tu colocaste no coração do homem uma profunda nostalgia de ti, e só quando te encontramos vivemos a paz: faze que, superando cada obstáculo, reconheçamos os sinais da tua bondade e, estimulados pelo testemunho da nossa vida, tenhamos a alegria de crer em ti, um verdadeiro Deus e Pai de todos os homens. Através de Cristo, nosso Senhor."

Após a homilia, a Liturgia da Paixão prosseguiu com a Oração universal e a adoração da Santa Cruz e se encerrou com a santa Comunhão.

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