Do ponto de vista natural, pode-se dizer que o sofrimento decorre da própria natureza do homem.
Todo ser dotado de sensibilidade está sujeito à dor, assim como à
alegria. Quando os objetos ou as pessoas estão em harmonia com sua
sensibilidade, ela experimenta prazer; quando, ao contrário, ferem essa
sensibilidade, ele sofre. É possível, portanto, sofrer sem culpa
própria.
Mas a fé nos ensina que o sofrimento entrou no mundo por causa do
pecado. Por um ato de bondade infinita e essencialmente gratuita, Deus
havia preservado o homem da dor.
Criado em lugar de delícias, ele devia, se fosse fiel a Deus, passar
deste Paraíso terrestre diretamente para o Céu, para nele gozar por toda
a eternidade, de uma felicidade sem sombras.
O pecado de Adão, transmitido a seus descendentes, veio transtornar
este belo plano. Com o pecado, a dor e a morte entraram no mundo, não
somente como uma consequência natural da sensibilidade, mas também como
um castigo pelo pecado.
Era justo: pois, tendo o homem pecado por um amor desordenado ao
prazer, para satisfazer o seu orgulho e a sua sensualidade, era bom que
ele sofresse para expiar a sua falta, e para sentir-se mais inclinado a
evitar toda a transgressão, vendo que há uma justiça imanente e que o
culpado é punido por seu pecado.
Assim, o sofrimento que parece ser um mal, torna-se um bem na ordem
moral, uma reparação e um preventivo contra novas transgressões.
Essa ideia se torna mais clara com o grande mérito da Redenção.
Para reparar a ofensa infinita cometida contra Deus por nossos
primeiros pais e por sua posteridade, o Filho de Deus consente em
fazer-se homem, e tornar-se o representante da Humanidade culpada, em
assumir sobre si o peso de nossas iniquidades, em expiá-las por trinta e
três anos de sofrimentos e, sobretudo, pela imolação no Calvário.
Assim, o sofrimento é reabilitado, enobrecido e divinizado. Já não é
mais somente um castigo mas um ato de obediência aceito voluntária e
generosamente por amor, um ato que, na pessoa de Jesus Cristo, tem um
valor infinito.
Por ele, Jesus glorifica a Deus muito mais do que o pecado que O
havia ofendido, e coloca o homem, sob vários pontos de vista, a um
estado superior ao de Adão inocente.
Esse ato tem para nós, portanto, as mais felizes consequências.
Associando nossos sofrimentos aos seus, Nosso Senhor lhe confere um
valor incomensurável.
Eles se tornam, não mais um castigo, mas uma reparação: nós havíamos
pecado por desobediência e por egoísmo; ao sofrer com Jesus e por suas
intenções, reparamos nossa falha por um ato de obediência e de amor.
Mas, além disso, utilizamos o sofrimento para progredir na santidade:
cada dor pacientemente suportada por amor a Jesus aproxima-nos de Deus e
aumenta nosso amor por Ele.
E aumenta, ao mesmo tempo, a glória que nos caberá no Céu: como
afirma São Paulo, nossas tribulações são breves e fáceis de suportar, em
comparação com a glória imensa e eterna que receberemos em recompensa!
Por isso o apóstolo se alegra em suas enfermidades e se gloria em
suas tribulações, feliz por uni-las às do Cristo Jesus e completar assim
Sua Paixão, para o maior bem da Igreja e das almas.
Milhões de santos, caminhando nas pegadas do Mestre, sofreram e
sofrem com alegria; dentre eles, muitos se ofereceram como vítimas, seja
à Justiça divina para expiar suas faltas e as dos outros, seja ao Amor,
para serem consumidos pela Divina Caridade, para viver e morrer como
mártires e assim ter uma parte maior na eterna visão e no eterno amor.
Fonte: TANQUEREY, A. “A Divinização do Sofrimento”
Imagem: Michael O’Brien
Colhido no site do Associação Apostolado do Sagrado Coração de Jesus